Por Jânsen Leiros Jr.
"
1 No princípio,
criou Deus os céus e a terra.
2 A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas
sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por sobre as águas.
3 Disse Deus: Haja luz; e houve luz”.
Gênesis 1:1-3
Aproxima-se a votação para os cargos de
presidente nas duas casas legislativas que compõem o Congresso Nacional; a Câmara
dos Deputados e o Senado Federal. É uma votação da qual o povo não participa,
ficando apenas a cargo dos senhores parlamentares de ambas as casas, decidirem
quem irá presidi-los na próxima legislatura, onde quase metade do Congresso foi
renovado nas eleições de 2018.
A presidência, tanto da Câmara, tanto
quanto a do Senado, é alvo de disputas históricas e de ocupantes os mais
variados, desde homens honrados que entraram para os livros de história do
nosso país, até os que tiveram seus nomes nas páginas policiais, homens cuja
posição de destaque e importância em um dos poderes da nação, não lhes conferiu
o poder de evitarem ser alcançados pelo braço da justiça, mais exatamente os braços da Operação Lava Jato.
Como é sabido de muitos, a operação que
vem tentando desfazer a rede de corrupção instaurada nos mais diversos níveis
da máquina pública, vem sofrendo ataques e tentativas de esvaziamento por parte
daqueles que temem a aproximação de suas garras, e a consequente e inevitável obrigação
de pagar pelos seus feitos... maus feitos!
No final do ano passado a Câmara votou
favorável ao fim do foro privilegiado, que colocava parlamentares inatingíveis
por processos contra “suas excelências”,
deixando os deputados e senadores mais acessíveis e desprotegidos das
investigações da Lava Jato e seus desdobramentos. Mesmo aos que se reelegeram
com a exclusiva intenção de fugirem de eventuais processos, com o fim do foro
privilegiado, terão mais dificuldades de escaparem ilesos.
No entanto, a presidência do congresso
confere ao ocupante um poder maior, tanto na condução das rotinas
parlamentares, como a capacidade de “barganhar” com o executivo o que quer que
lhe convenha, pois constitucionalmente os poderes executivo e legislativo se
equivalem. Ah, você achava que a disputa pela presidência do Senado e da Câmara
era apenas uma questão de vaidade política? Lamento macular sua ingenuidade.
Na condição de presidente, o ocupante do
cargo determina a pauta de votações no congresso, o rito das tramitações, e o
tempo com que tudo acontecerá nas casas. E quem depende dessa engrenagem para efetivamente
governar o país? O presidente da república e sua equipe. Dessa forma a política
no seu traço mais fisiológico, trabalha na adequação e conciliação dos
interesses das partes, quase nunca havendo qualquer preocupação com os
interesses da nação.
Até aí, você diria, tudo bem. Mas o que
tem a ver isso tudo com a discussão que chegou ao STF, quanto ao rito de
votação, ou seja, ser votação secreta ou não? E eu responderia, tudo. Sim,
porque mais precisamente em relação ao Senado Federal, um dos pleiteantes ao
cargo é Renan Calheiros, sabidamente alvo de algumas ações do MPF, no contexto
mais amplo da Lava Jato. Se expostos em seus votos, os senadores terão dificuldades
em se alinharem a Renan Calheiros. Já o voto sendo secreto, eles poderão
atender às suas conveniências, sem terem que dar satisfação de suas escolhas a
seus eleitores.
O que isso significa na prática?
Significa que alguma coisa que não pode ser exposta aos meros eleitores, está
alimentando a decisão daqueles que foram escolhidos por esses mesmos eleitores,
para os cargos que agora ocupam. Aliás, um costume bastante conhecido em nosso
país; o total descolamento dos interesses dos eleitores, dos interesses pessoais
e conveniências de seus representantes.
Ora, não foi sem razão que o texto da
narrativa bíblica da criação do mundo começa confrontando trevas e luz. Caos e
ruinas era o que as trevas escondiam; a condição original daquilo que viria a
ser o lugar que habitamos. E para que tais condições pudessem ser alteradas, para
que algo proveitoso pudesse ser criado, - haja
luz. Porque na escuridão nada se cria. Jesus mais à frente irá dizer que “importa trabalhar enquanto é dia, pois à
noite ninguém pode trabalhar.” Obviamente ele se refere a realizar o que
deve, às claras, na frente de todos, para proveito de todos. O evangelista João
também dirá que “não vieram para a luz,
para que suas obras não fossem reveladas”. Ora, a quem interessa realizar
algo às escondidas, senão aqueles cujas intenções não podem ou não devem ser
reveladas, para benefício exclusivamente próprio?
Enfim, nota-se pela avidez para que a
votação seja secreta, que o espírito da transparência segue assombrando a
metade não renovada do Congresso Nacional. Para esses, o interessante é que
tudo continue em trevas, sem luz, para que suas ruinas e o caos que promovem
com o patrimônio público, sigam atendendo suas particulares e irreveláveis
demandas. O pior é que ainda encontram quem os legitimem.