sábado, 23 de fevereiro de 2019

Deforma da Previdência


Por Jânsen Leiros Jr.

Que temos que realizar ajustes no sistema previdenciário brasileiro não resta dúvidas. A gradativa inversão da pirâmide etária que define o perfil da população brasileira, aliada ao aumento da expectativa de vida do brasileiro, nos aponta para um quadro de inviabilização das contas do instituto, uma vez que o contingente de contribuintes se torna menor que o de beneficiários do sistema. Acontece que o déficit da previdência, tão defendido pelo poder público e divulgado pela mídia a todo pulmão, não tem sua origem única na simples conta menos contribuintes x mais beneficiários.


A CPI da Previdência, presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), avançou em seus trabalhos nos últimos meses, a despeito do proposital esquecimento que a comissão sofreu, por parte dos principais meios de comunicação do país. O resultado do aprofundamento nas causas do déficit da previdência, apresenta uma conjunção de fatores que contribuíram, contribuem e que continuarão a contribuir para que as contas se mantenham no vermelho, caso os governos e as lideranças políticas do país, não sejam impedidas de fazer do tesouro da Previdência, um fundo a mercê de seus interesses políticos, e de socorro para o fechamento de outras despesas da máquina pública.

Conforme o relatório de mais de 250 páginas da CPI[1], a dívida das empresas privadas com a previdência chega a exorbitantes R$ 450 bilhões de reais, dos quais apenas R$ 175 bilhões (como se uma soma dessa pudesse ser chamada de apenas) são recuperáveis, ou seja, passíveis de serem de alguma forma consignados aos cofres da Previdência. Isso significa que os outros R$ 275 bilhões, ou seja, mais de 60% da dívida acumulada por empresas privadas, é considerado perdido. Tal valor é R$ 100 bilhões superior ao déficit público das contas do governo, constante no orçamento da união para 2019.

O que o relatório da CPI, finalizado pelo senador Hélio José (Pros-DF) detalhadamente esclarece, é que o rombo nas contas da Previdência resulta de péssima gestão em sua arrecadação, e do uso indiscriminado de seus fundos para constantemente socorrer o endividamento dos governos, incapazes de manterem o equilíbrio de seus gastos nos limites de suas receitas. Ora, não seria o caso de primeiro vermos impedidos os socorros concedidos aos governos, e a irresponsabilidade fiscal na arrecadação da Previdência, antes de simplesmente fazermos contas que prejudiquem os trabalhadores, contribuintes desse tesouro? Não seria uma demonstração de real interesse de solução do problema previdenciário, o uso dos resultados do trabalho da CPI na definição do plano de ação, e nas contas que precisam ser feitas, para fundamentar o projeto de lei encaminhado pelo governo ao Congresso? E por último, não nos causa estranheza que os principais devedores da Previdência, sejam exatamente os mais interessados na celeridade de aprovação da reforma, bem como os divulgadores da necessária reforma?

Uma reportagem da Carta Capital ainda em 2017[2], trouxe números interessantes que flagram alguns interesses conflitantes sobre o assunto. Segundo a matéria, “73 deputados e 13 senadores estão ligados a grupos devedores da Previdência”. Ainda considerando a reportagem, os interesses diretos ou indiretos de suas excelências representam uma dívida de mais de R$ 370 milhões de reais com o instituto, contribuindo eles mesmos, os interessados na reforma do modelo previdenciário, para o rombo de suas contas.

O relatório da CPI, contudo, não se atém apenas a apontar as origens do buraco financeiro em que se encontra o INSS. Ele também elenca uma série de medidas, ora por emendas à Constituição, ora por projetos de lei, necessários para que o dinheiro da Previdência deixe de ser utilizado pelos governos que se sucedem, garantindo assim a saúde das contas da previdência ao longo dos anos de arrecadação.

Pode ser que, mesmo depois de considerados esses fatores evidenciados no relatório da CPI, mudanças no tempo de contribuição sigam necessárias e urgentes. A princípio não há nada que comprove o contrário. Mas em um país onde o preconceito contra profissionais acima dos 40 anos é flagrantemente exercido em processos de recrutamento e seleção Brasil afora, como garantir que a parcela mais necessitada da população, venha a ter acesso aos benefícios da Previdência, ao final de um tempo de contribuição que ela não conseguirá chegar, pelo menos não formalmente?

O receio nisso tudo, habita na possibilidade de estarmos criando um monstro voraz, que contribua ainda mais para o agravamento da barbárie social aguda que temos em nosso país. Porque se na realidade excêntrica do mundo em que vive pessoas como o deputado Rodrigo Mais (DEM_RJ), em que pessoas de 80 anos, segundo declarou, trabalham “naturalmente”, na realidade triste e sombria habitada pela grande massa de trabalhadores do país, que vive sem educação, sem saúde e segurança pública, chegar aos 50 com vida já é uma vitória. Trabalhando, então, é um verdadeiro milagre. Como evitar o discurso do “eles” e “nós”, se quem pode mitigar a dor dessa gente, segue legislando em benefício próprio, indiferente ao clamor de suas sofridas condições?

Quem sabe a ideia de suas excelências seja exatamente essa; contribuição mais longa, aumento de arrecadação, redução dos benefícios concedidos por falta de requerimento, e uma oportuna e inevitável sobra de caixa. Assim haverá fundos para oportunas emendas parlamentares e tantas outras manobras políticas, sempre úteis para o atendimento dos interesses políticos e pessoais de nossas doces iminências? Espero que não estejamos trabalhando para um mal ainda maior.


Um comentário:

  1. Os japoneses se aposentam com Dez anos de contribuição e o país é rico em crescente. Como funciona a economia lá? Somos inteligentes o suficiente pra saber que podemos espelhar quem tem sucesso. Mas pra quê né?

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