quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Mais do mesmo e ainda pior


Por Jânsen Leiros Jr.


25 Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Todo reino dividido contra si mesmo ficará deserto, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá.
Mateus 12:-25


Costumo ser avesso a posicionamentos acalorados e efusivos, pois entendo que na maioria das vezes, quem assim se coloca, corre o risco de deixar de fora algo que não percebeu sobre o assunto. E por isso tentarei ser minimamente emocional, ainda que contundente, para que não ultrapasse o limite do imparcial, mesmo que de imparcial pouco ou quase nada tenham minhas motivações; milito flagrantemente em favor do Brasil.

A campanha de segundo turno para eleição de presidente da república está repetitiva e reveladora. Repetitiva no baixo nível de ataques de parte a parte, e na incapacidade de se apresentar propostas exequíveis e projetos de país, que deixem o conforto de seus programas de governo quase escondidos em sites pouco acessados, e ganhem as ruas e o interesse da população, demonstrando claramente onde querem chegar, e como e a que preço. Em vez disso, repetem a velha máxima de dizerem o que o povo gosta de ouvir, polarizando a campanha e dividindo o eleitorado entre eles e nós. Tudo bem que nessas características ambos os lados tenham suas proeminências, mas tal perfil de campanha cola igualmente em ambas as campanhas.

Ora, o que há de novo então? Quase nada, mas de revelador, muita coisa. E podemos começar pela maneira declarada como a mídia quase que em sua totalidade, decidiu-se por um dos lados, direcionando seu jornalismo a apurações viciadas e a noticiários tendenciosos. E mais, à medida que nos aproximamos do pleito, intensifica-se a farta distribuição de frases e atos, vistos e ouvidos convenientemente, de modo a influenciar direta ou indiretamente nos resultados das urnas.

Ora, não há aqui qualquer inocência quanto a inevitável postura assumida em favor desse ou aquele candidato, que qualquer meio de comunicação acaba por declarar nas entrelinhas. Mas ser tão explicitamente contra um dos lados, e praticamente tentar decidir o pleito goela abaixo da população, é completamente incomum e revelador da imensa preocupação com a eventual vitória do candidato a quem não escolheram. O extremo empenho em desconstruir a imagem de um em favor do outro, já passou dos limites aceitáveis da predileção, e avança pelos descaminhos da tentativa imprópria de induzir e influenciar a benefício próprio, o livre direito de escolha da população. Inevitavelmente vem à mente um simples questionamento: o que pretendem ou o que temem?

E se de um lado temos a imprensa formal  trabalhando conforme suas conveniências, do outro temos uma incômoda e frenética produção de notícias falsas entupindo as redes socias, causando alarmismo desenfreado, em quem tem boa fé e entende que uma escolha democrática, passa pela lisura do processo, e que temem ter esse processo corrompido, a despeito da escolha legítima da maioria. Fraudes, factoides e ameaças à integridade dos candidatos, entram e saem de nossos celulares e computadores, numa enxurrada de versões e acusações mútuas, que revela uma insuportável tentativa de manipular as massas. Seja pela mídia convencional, seja pelas redes sociais, há um sôfrego movimento que tenta roubar eleitores no limite de suas escolhas.

Jovem é indiciada por falsa comunicação de crime
 Nesse mar de lama e baixaria, urnas são encontradas com votos supostamente pré imputados, frases despretensiosas são comentadas como declarações de intenção, minorias são incitadas a reações desproporcionais, e esquemas e estratégias teatrais são descobertos por meios suspeitos, e divulgados por gente sempre muito confiável. Isso sem falar em torturados equivocados e entrevistas bombas que desmontariam uma ou outra candidatura. Uma verdadeira guerra de desinformação e desconstrução do adversário.

De tudo isso, porém, há algo que me entristece e preocupa crescentemente. É flagrante o crescimento da intolerância e do desejo de poder sobre o outro, tanto na imposição das ideias, quanto da uniformidade de opiniões. É claro que qualquer um tem o direito de não querer me ouvir, ou mesmo de não querer ler o que eu escrevo. E é simples exercer esse direito. Basta não me dar ouvidos, basta não querer nem mesmo ver esse meu texto. Nesse ato há direitos garantidos; o meu de falar, e o do outro de não me ouvir. O meu de escrever e do outro de sequer querer ler. Simples assim. Mas o que estamos assistindo de forma crescente e galopante, e que não deverá recuar nem mesmo com o fim das eleições, é o impulso incontrolável que se declara vívido em muitos, de querer me calar a voz, arrancar da mão a caneta, e de obrigar o semelhante a ouvir e a ler o que o outro pretende.

Urnas fraudadas teriam sido encontradas
já com votos computados em favor de um dos candidatos
Para ficar mais familiar o que digo, nunca antes na história desse país, democracia foi uma palavra tão abertamente repetida, mas tão pouco efetivamente defendida. Porque a condição preponderante da democracia é o direito à expressão, a liberdade de pensar diferente, e a possibilidade de opinar sobre qualquer coisa. E isso não vem mais acontecendo em nossa sociedade. Se alguém ousar desses direitos fazer uso, é tolhido, cerceado, alijado, ou ainda sofre bullying. É quase sempre interpretado à luz de vieses ideológicos viciados, e é rotulado com palavras que visam agredir, e que trazem em seu conceito, muito mais do que se pretende dizer. Ou é falta de vocabulário dos agressores, ou crueldade semântica de verdade. Ou seriam as duas coisas?

De qualquer maneira, e seja por qual motivo for, estamos experimentando um verdadeiro racha da sociedade brasileira. E esse racha se estende a amizades e laços familiares, onde integrantes se agridem e se detestam por conta de suas predileções políticas. Mesmo em comunidades religiosas assistimos o velho e visceral exercício do desejo de se sobrepujar ao outro, de se impor ideias e modelos particulares de se ver o mundo. Quais as chances de sairmos melhores de um momento como esse? Quais as possibilidades de construirmos um país melhor, se a hipótese de descartarmos pessoas contrárias é admissível, diante do triunfo de nossas predileções políticas? Todo reino dividido contra si mesmo ficará deserto.

Até quando nos permitiremos ser o que querem que sejamos? Até quando iremos credulamente crer no que querem que creiamos? Até quando beijaremos a mão dos coronéis? Até quando expressaremos a vontade de terceiros, ou lutaremos por ideais que nos impõem? Que tenhamos sempre consciência crítica sobre o que nos oferecem de informação, e fortaleçamos o sentimento de que estamos todos no mesmo time. Somos uma nação, somos todos brasileiros.

2 comentários:

  1. Penso assim também. Não importa quem vai ganhar o pleito, todos nós já perdemos como nação por causa da nossa desunião. Ainda bem que tudo passa. Espero que ao menos nos sirva a lição e nos torne pessoas melhores de alguma forma.

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  2. Excelente! É isso mesmo. Parabéns.

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