domingo, 22 de setembro de 2024

Quando a retórica é tão ou mais cruel que a realidade

Por Jânsen Leiros Jr.

“Há de fato um aumento preocupante nas mortes de crianças indígenas entre 2022 e 2023. De acordo com o relatório "Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil", elaborado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), as mortes de crianças indígenas de 0 a 4 anos aumentaram 24,55% nesse período. Em 2022, foram registradas 835 mortes, enquanto em 2023 o número subiu para 1.040. O Amazonas lidera os estados com o maior número de casos, seguido por Roraima e Mato Grosso. Esses dados foram obtidos através do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e do Sistema de Informação da Atenção à Saúde Indígena (Siasi)” – matéria do Link Our View 

 

"A mentira política não consiste em dizer o que não é verdade, mas em apresentar como verdadeira uma promessa que não tem intenção de cumprir." – Hannah Arendt (1906-1975)

"O homem superior age antes de falar, e depois fala de acordo com suas ações." – George Orwell

"O objetivo do poder é o poder. E as mentiras são usadas como ferramentas para mantê-lo." – Confúcio

É revoltante e doloroso observar que, mesmo com a troca de governo e a criação do tão alardeado Ministério dos Povos Originários, a realidade vivida pelas crianças indígenas no Brasil continua trágica e inaceitável. Entre 2022 e 2023, houve um aumento expressivo na mortalidade infantil entre crianças indígenas de 0 a 4 anos, totalizando 1.040 óbitos em 2023. Esse número reflete não apenas o abandono, mas também o descaso flagrante com essas populações vulneráveis. São mortes que poderiam ser evitadas com medidas básicas de saúde, como acesso a medicamentos, saneamento adequado e alimentação, especialmente considerando que muitas dessas mortes foram causadas por desnutrição e a falta de remédios simples.

O descompasso entre o discurso oficial do governo e a realidade no terreno é gritante. No plano retórico, houve a criação de um ministério, chefiado por uma mulher indígena, algo que parecia, à primeira vista, um avanço concreto na representação e no cuidado dos povos originários. No entanto, a gestão e a prática mostram que pouco foi feito para mudar a dura realidade de quem vive nas comunidades indígenas. Como pode um governo que se comprometeu a proteger esses povos permitir que crianças morram por falta de assistência médica básica?

O discurso de proteção dos povos indígenas é vazio enquanto vidas são perdidas em números tão alarmantes, especialmente quando se sabe que essas mortes são evitáveis. A promessa de apoio e proteção virou uma verdadeira farsa. Não basta criar ministérios ou cargos de destaque se as políticas não chegam às aldeias, se o apoio efetivo não alcança as crianças que morrem por doenças curáveis ou evitáveis.

Os Yanomami, em particular, enfrentam uma crise humanitária devastadora, que se agrava pela presença de garimpeiros ilegais em suas terras, contribuindo para o aumento da mortalidade infantil. A falta de controle sobre essas invasões é uma evidência gritante de que o Estado falhou na proteção das comunidades, permitindo que seus territórios fossem saqueados, seus recursos roubados, e suas crianças morressem pela omissão de políticas públicas.

É inadmissível que, em pleno século XXI, um país com tantos recursos como o Brasil continue negligenciando os povos indígenas, que há séculos são sistematicamente marginalizados e abandonados. As mortes de 1.040 crianças indígenas em 2023, e as mais de 3.500 nos últimos cinco anos, são um verdadeiro escândalo humanitário. O governo federal precisa ser veementemente cobrado a atuar com urgência para reverter esse cenário de genocídio silencioso.

Este é um apelo por ação imediata! A criação de um ministério e a promessa de atenção especial aos povos originários não podem continuar sendo apenas um gesto simbólico e vazio. É preciso transformar o discurso em realidade, com uma presença constante e eficaz do Estado nas aldeias, garantindo assistência médica, segurança alimentar e condições dignas de vida para as crianças e suas famílias.

O Estado brasileiro deve ser responsabilizado por essa tragédia e, acima de tudo, precisa agir rapidamente para estancar o sofrimento de tantas comunidades que, mesmo após séculos de exploração e desrespeito, ainda lutam desesperadamente pela sobrevivência de suas crianças.


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